Manaus (AM) – O Tribunal de Contas do Estado do Amazonas (TCE-AM) admitiu uma denúncia contra a Câmara Municipal de Itacoatiara (CMI), a 176 quilômetros de Manaus, abrindo caminho para uma investigação sobre possíveis irregularidades no concurso público da Casa Legislativa. O documento de admissão foi publicado nessa quinta-feira (5), no Diário Oficial do TCE-AM.
A denúncia protocolada junto ao TCE-AM aponta uma série de possíveis irregularidades no processo de dispensa de licitação realizado pela Câmara para contratar empresa responsável pela realização do certame com 28 vagas de níveis médio e superior.
O denunciante sustenta que a dispensa de licitação foi indevida, além de apontar falhas como ausência de documentos obrigatórios, falta de transparência, canal oficial inoperante para envio de propostas e modelo de remuneração que pode gerar prejuízo ao erário.
Uso indevido da dispensa de licitação
Um dos principais pontos questionados é o uso da modalidade de dispensa. Conforme o denunciante, o valor estimado da arrecadação com as taxas de inscrição ultrapassa os R$ 200 mil, valor bem acima do limite legal de R$ 62.725,59 estabelecido para esse tipo de contratação em 2025, conforme a Lei nº 14.133/2021 (nova Lei de Licitações).
Segundo o projeto básico, a empresa contratada será remunerada exclusivamente com os valores das inscrições, fixadas em R$ 165 para cargos de nível superior e R$ 95 para nível médio. O item 3.7 do documento afirma:
“Caso o número de candidatos inscritos seja superior a 2.000 (dois mil) candidatos, a contratada não repassará à contratante o valor arrecadado a mais, tendo em vista que o montante do valor decorrente do pagamento das inscrições cobrirá integralmente o custo do certame.”
Para o denunciante, esse modelo demonstra que a estimativa mínima de arrecadação já extrapola o limite legal para dispensa, o que por si só tornaria obrigatória a realização de um procedimento licitatório.

Falta de transparência e documentos obrigatórios
Outro ponto destacado é a ausência de documentos essenciais. O Projeto Básico foi publicado no site da Câmara, mas não há Termo de Referência, Estimativa de Custos, Cronograma ou Certidões de regularidade fiscal, documentos exigidos pela Lei nº 14.133/2021.
Além disso, a denúncia aponta que não houve publicação do processo no Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP), o que é obrigatório para municípios com mais de 100 mil habitantes, como é o caso de Itacoatiara.
“A inexistência de documentos essenciais, somada à falta de divulgação em plataformas oficiais obrigatórias, compromete a lisura do certame e limita o acesso à informação, violando os princípios da legalidade, publicidade e transparência previstos na Constituição Federal”, afirma o texto.
A denúncia também revela que o e-mail fornecido pela Câmara para o envio de propostas ([email protected]) estava inativo, com retorno automático de erro aos remetentes. Isso impossibilitou o envio de propostas por parte de interessados, o que compromete o princípio da publicidade e da ampla concorrência.
Modelo de remuneração pode causar prejuízo ao erário
O modelo financeiro adotado pela Câmara de Itacoatiara também é criticado. Segundo o denunciante, a empresa contratada poderá lucrar ilimitadamente com o excedente das inscrições, sem qualquer obrigação de repasse à Administração Pública, o que compromete o princípio da economicidade.
“A ausência de um limite de arrecadação ou de uma cláusula de repartição do excedente afronta diretamente os interesses do erário, permitindo que o lucro da contratada ultrapasse o montante necessário para a execução do serviço sem qualquer controle por parte do órgão contratante”, diz o documento.
A denúncia cita ainda a possibilidade de enriquecimento ilícito e infrações à Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/1992), caso fique comprovado prejuízo ao erário.
No documento de admissão da denúncia, a conselheira e presidente da Corte de Contas disse que a denúncia preencheu todos os requisitos formais, com documentos que contém indícios das ilegalidades alegadas. “Tais questões devem ser apuradas pelo relator do feito, nos moldes do art. 3º, II da Resolução nº 03/2012
TCE/AM. Pelo exposto, com fulcro na Resolução nº 03/2012 e no Regimento Interno do TCE/AM“, diz a conselheira.
A decisão, expressa no Despacho nº 349/2025-GP, não apenas admite a denúncia, como também acena com a possibilidade de concessão de medida cautelar, algo que pode paralisar atos administrativos ou contratos suspeitos — uma espécie de freio de emergência diante da ameaça de lesão ao interesse público em Itacoatiara.
A reportagem entrou em contato com o vereador Arinaldo Guimarães (Mobiliza), presidente da Câmara Municipal de Itacoatiara, mas até o fechamento desta matéria, não obteve resposta.